sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Sexo casual, por Neruda

"No táxi nos esperava a moça da boite, a única que não nos abandonou em nosso infortúnio. Alvaro e eu a convidamos para saborear a sopa de cebolas do amanhecer no Les Halles. Compramos flores no mercado para ela, beijamo-la em reconhecimento por seu comportamento de boa samaritana e nos demos conta de que tinha certo charme. Não era bonita nem feia mas o nariz arrebitado de parisiense a reabilitava. Então a convidamos para o nosso misérrimo hotel. Não se fez de rogada em ir conosco.
Foi para o quarto de Alvaro. Caí rendido na cama mas logo senti que me sacudiam. Era Alvaro. Seu rosto de louco manso pareceu-me um tanto estranho.
- Está acontecendo uma coisa - disse. - Esta mulher tem algo excepcional, insólito, que não poderia te explicar. Tens que experimentá-la já.
Poucos minutos depois a desconhecida meteu-se sonolenta e indulgentemente em minha cama. Ao fazer o amor com ela, comprovei seu dom misterioso, algo indes-critível que brotava de suas profundezas, que se remontava à origem mesma do prazer, ao nascimento de uma onda, ao segredo genesíaco de Vênus. Alvaro tinha razão.
No dia seguinte, no café da manhã, Alvaro me chamou a parte e me preveniu em espanhol:
- Se não deixamos logo esta mulher nossa viagem vai ser um fracasso. Não naufragaríamos no mar mas no sacramento insondável do sexo.
Decidimos cumulá-la de pequenos presentes: flores, chocolates e a metade dos francos que nos restavam. Confessou-nos que não trabalhava no cabaré caucasiano, que o havia visitado na noite anterior pela primeira e única vez. Logo tomamos um táxi com ela. O chofer atravessava um bairro indefinido quando mandamos que parasse. Despedimo-nos com grandes beijos e a deixamos aí, desorientada mas sorridente.
Nunca mais a vimos."

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